terça-feira, 15 de março de 2022

Sobre a reputação

O celebrado professor Clóvis de Barros Filho escreveu que "a reputação é um eu fora do meu alcance." 

E, certamente, muitos concordarão com essa assertiva, visto que as pessoas sempre vêem os outros de forma particular, seguindo a sua percepção ou acompanhando comentários de terceiros.

Ao contrário do que se pensa, não se constroi a própria reputação. A não ser com relação a alguma característica específica, não no aspecto geral.

Por vezes, se faz uma "leitura" de pessoas pelos olhos da desconfiança, - envolto em infundado preconceito, por espelho de si próprio ou mesmo por desenho produzido por desafetos dissimulados que formam uma narrativa bem urdida, deturpando elementos inconcludentes com elementos ardilosos, tornando-os definitivos. E como qualquer quimera dita por muitas bocas é tida como real, o julgamento está consumado pelos "juízes" que serão assim, também, julgados.

A escritora Sarah Maclean escreveu: "Minha reputação está arruinada porque eu sou uma mulher, e nós, mulheres, não nos pertencemos. Nós pertencemos ao mundo, desde o nosso corpo até a nossa alma e nossa mente.

Alberto Magalhães

domingo, 3 de setembro de 2017

O ritual da vida, da morte e do amor

Não exaltei qualidades dos finados nem contei histórias sobre eles naqueles momentos de pesar. A minha lágrima ou simples expressão de tristeza, me foram bastante. O silêncio é a maior expressão de pesar e respeito por aquele que nada mais ouve nem vê. Um abraço confortador no que sofre e a presença em homenagem ao que parte é elementar no ritual do sepultamento. Naquele ato, falar em qualidades é exaltar os defeitos (o jornalismo está livre disso). Quem morre torna-se apenas um corpo e não é pela sua vida ou por seus feitos que se está ali, mas pela sua morte, pelo seu fim nesse nosso plano. E não há glória espiritual na morte. Exceção foi a de Cristo, que não morreu por seu parente, por sua própria honra, por seu país... Ele morreu pela paz de todos e por amor a todos. E não foi vencido por ela, mas subjugou a morte.

Um minuto, uma hora, um dia de silêncio é essencial e retrata bem o espanto e o pesar pela morte de alguém querido. Porque a morte é o vazio pleno, a ausência real, a perda absoluta, a separação completa... poderia o enlutado, naquele momento, diante da morte, se rir de todos os viventes, não fosse a dor inteira que sente. A tragédia sempre foi mais forte que a comédia. Vemos isso nos eruditos gregos, em Dante e em Shakespeare. Pois a morte é a cessação de todas as glórias, sonhos e aspirações nesse mundo de expiação e catarse. Contudo os vivos se iludem com a vida, esse sopro que se esvai por banal motivo. Temer a morte é ter medo do inevitável. A poetisa Nádia F. M. de Amorim escreveu: “Minha morte nasceu quando eu nasci/Despertou, me enlaçou, cresceu comigo/E dançamos de roda ao luar amigo/na pequenina rua em que vivi”.

Usando parte do poema Rima de Seféris poder-se-ia descrever o ápice do sentimento da perda de alguém muito importante: “É esta a hora em que sufoca a tarde/E eu me afadigo a procurar as trevas...” Do último que sepultei, disse aos seus parentes: “era meu amigo”. Mas ser amigo não é qualidade, é opção. A gente escolhe de quem ser amigo. Não lhes disse do pai amoroso que ele era. Se fosse necessário dizer isso a seus filhos é porque eu havia me enganado. O nosso amor mais profundo está nisso: nos filhos porque escolhemos tê-los e nos pais porque escolheram nos ter. Mas, amor sublime está no de Cristo, sobre o qual alguém muito bem escreveu: “Jesus, para entender o seu amor basta entender que as flores não vão nascer sem que exista uma semente para oferecer a sua própria vida, morrendo e gerando outras vidas, como tu fizeste”...

Alberto Magalhães

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O que é o amor

O amor é um sentimento pleno, não só uma emoção circunstancial existente em momentos especiais. O amor é o se esvaziar de si e encher-se do outro.  É encher o outro de cuidados e ensinamentos práticos do ser melhor a cada dia. E esvaziá-lo da carência de ser querido, dizendo, sem as palavras: você é importante aqui dentro de mim.  O amor pleno renuncia ao egoísmo, nega-se ao individualismo, joga fora as dúvidas. O amor não tem pressa. Amar é o se dar sem o interesse imediato de retorno. É doar um amor digno, decente, virtuoso para que quando ele fizer eco no outro ser volte da mesma forma: inteiro, transparente, superior. 

O amor tem ternura nos olhos, carinho na voz, amparo nos gestos e compreensão nas falhas. O amor é água para o sedento, pão para o faminto, agasalho para o corpo frio, consolo para o desalentado, resposta para o coração humano. A fé traz o amor, a esperança o fortalece, a doação o faz soberano. Na casa do desamor o pão não tem bom sabor, a lareira não dá o calor adequado, o vinho não alegra. A vida é insípida. No final do tempo o sábio inquirirá: diga-me o quanto você amou e te direi o quanto você viveu. O porteiro da eternidade olhará para a tua luz que você não vê e olhará a sua cor para saber com os quais você irá habitar. O amor é translúcido na cor, tem um brilho próprio de ser.

O QUE É A FELICIDADE

Você não me faz feliz. A felicidade verdadeira resulta do encontro espiritual da criatura com o Criador. Dizem que o sol ilumina as estrelas, você ilumina os meus olhos; que o sol aquece a terra, você aquece o meu coração. O meu sorriso mais verdadeiro é você quem traz. Também minhas melhores lembranças, meus gestos mais ternos, meus sonhos mais românticos, os momentos de entrega total, a meiguice que eu não sabia que existia em mim. Nas minhas alegrias mais profundas você esteve presente. Você coloriu dias sombrios, noites insones, instantes cinzentos... Fui seu como jamais fui ou serei de ninguém.

Você teve um corpo e uma alma dormindo em seus braços, viajando no seu rosto – a cada acordar, se derramando no seu interior quente, desmaiando no seu peito, a dormir sonhando. Fiz o seu mundo meu e acordei sonhos antigos de ser feliz. Busquei construir um castelo ao seu redor, convidando anjos para lhe sustentarem nas mãos. Sofri a cada lágrima que descia da sua face, exultei a cada sorriso seu, vibrei com cada vitória conquistada, também fiz meus os seus momentos de solidão existencial, compartilhei suas dores. Percebo, agora, que nunca soube falar apenas sentir. Não lhe disse tantas coisas, imaginando que soubesses.

Portanto, não me julgue mal por não conseguir ser o que você esperava que eu fosse, se não posso lhe fazer feliz. Eu, também, senti vazios. Por vezes, me senti só. Embora tentei dar o melhor de mim e você foi o melhor que conseguiu ser nós não temos o poder de fazer alguém feliz. Eu escolhi amar você, o meu amor é meu. Já a felicidade não está retida no meu coração, eu não sou a sua fonte. Talvez ela escolha os corações menos exigentes para fazer morada.


Alberto Magalhães

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A superioridade do amor

A vida, esse fardo que temos que levar sem que o tenhamos encomendado. Uma enigmática dádiva e um difícil caminho é esse sopro que se chama vida. Para onde nos levará? Para a evolução ou para o caos? Devemos ser mais que um instrumento de realização pessoal, contribuindo para a interação interpessoal e a evolução social. A humanidade reside em todos nós. A vida nos fez ser alguém, façamos dela algo significativo para o mundo. Não somos fungo ou bactéria para deteriorarmos o ambiente em que vivemos.

Às vezes somos tão previsíveis na mesquinharia dos sentimentos, nos gostos, nas vontades, nas opiniões, na idolatria (das coisas e pessoas banais), nas caras e bocas. No entanto tantos de nós nos achamos tão especiais. Sem imaginarmos o tanto que somos parecidos. Sucumbimos ante o apelo de tribos e grupos seletos fazendo-nos em “sociedade perfeita”. Fazemos da acepção de pessoas um selo de qualidade e superioridade abolindo a “natureza imperfeita” de outros, como Hitler na teoria da “supremacia da raça ariana” extirpando os homens inferiores. Superioridade? Carregamos impurezas demais no corpo e na alma para tal. Gostamos de representar – atores da vida real - quando o melhor é sermos naturais. Ainda há pessoas do povo que são exploradas, no seu ofício, pelos “superiores” sociais.

O perfume das essências mascara o cheiro natural. A maquiagem mascara as falhas do rosto. A tintura, os cabelos da idade maior. O dinheiro, a pobreza de espírito. As roupas caras, a feiura do coração. O conhecimento, a idiotia comum dos inteligentes e dos ignorantes. A vaidade tenta inutilmente superar as falhas inglórias da natureza humana: os maus costumes do corpo e a indignidade da alma. Todos nós temos muito mais do medíocre que do gênio. O mais simples dos homens foi Jesus, porque era tudo de bom e nunca se vangloriou disso. A tônica da sua vida, entre os homens, foi o amor. Fez-se assim para ganhar a todos. É um ícone universal, admirado por bilhões de pessoas. Ninguém resiste ao amor.

Alberto Magalhães

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

A dor nasce do desejo

Tudo o que os nossos olhos veem de interessante o nosso coração deseja. Deus nos dá tudo o que precisamos para viver, tudo o que podemos ter. Mas queremos nos dar mais. Muitas das vezes, de forma incondicional, inconsequente, inescrupulosa.  “A dor nasce do desejo” disse Siddartha Gautama. Mas não de qualquer desejo. Há desejos que só nos exigem deveres, dedicação, cansaço, renúncias, algum sacrifício. Mas há aqueles que nos trazem dissabores, amarguras, frustrações, infelicidade. Estes são aqueles que não eram para serem desejados. E se inevitavelmente desejados, nunca alimentados. Se alimentados, nunca realizados. Porque, ao se realizar, o seu curto sabor de mel ensejará um longo, ou permanente, sabor de fel.

O soldado pintor Adolf Hitler desejou governar a Alemanha e fazer daquele povo uma nação superior em todo o mundo. Para tanto pregou apaixonadamente a qualidade da raça ariana dos alemães, avocando para estes a supremacia racial e o direito à liderança mundial. Nos moldes dos antigos impérios, a exemplo do romano, babilônico, medo, persa, etc. Hitler, em verdade, desejava antes realizar o seu desejo oculto de se tornar superior às demais pessoas a fim de superar a sensação de mediocridade em que estava inserida a sua vida comum e frustrante. Mas o seu desejo causou muito mal. Os resultados dessa aventura mirabolante todos sabem. A consequência dela atingiu centenas de milhões de pessoas mundo a fora.

Foram vários países atacados; dezenas de cidades bombardeadas; milhares de residências, casas comerciais e órgãos públicos destruídos; mais de vinte milhões de pessoas mortas, entre elas seis milhões de judeus foram sacrificados mediante tortura. Famílias foram dizimadas deixando tantos órfãos. Até navios brasileiros que cruzavam a nossa costa foram afundados. Tesouros artísticos foram saqueados. Cidades da Alemanha, Polônia, Itália, etc. ficaram em ruínas, muitos sobreviveram na miséria. O mundo chorou e sofreu essa tragédia. Tudo isso por um povo haver seguido o desejo de um visionário louco. As nações aprenderam muito com esse acontecimento tornando improvável que outra guerra mundial ocorra.

Porém muitas outras tragédias têm ocorrido por causa do desejo. Seja ele de natureza pessoal, financeira, religiosa ou política: no Iraque, por causa de Saddam Hussein. Na Líbia, por causa de Muamar Kadafi. Na Síria por causa de Bashar al-Assad. Os atentados causados pelos ideais religiosos ou libertários dos grupos extremistas que operam pelo terror. No Brasil por causa da corrupção, da delinquência, do desmatamento... Há desejos não revelados de se enriquecer desonestamente, de se praticar infidelidade conjugal, traindo a confiança do outro, de destruir a boa reputação alheia, de exterminar o desafeto... O desejo oculto sempre é egoísta, desagregador, indigno. Faz mal primeiramente a quem o concebe. Depois, aos próximos.

Alberto Magalhães

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Escrever

Era um papel branco e vazio. Surgiu primeiro o E. E daí uma frase. A segunda se iniciou com um S. A terceira com um E. E assim foi linhas a fora. Pouco antes, havia dito pra ela: Você está aqui dentro de mim maior que o mundo que eu avisto, ocupando todos os meus espaços. Mas, também existia o horizonte pleno a me convidar para outras caminhadas. Ficar é morrer aos poucos a cada entardecer. Não morrer de verdade, diga-se a bem da verdade, mas é abrir mão dos múltiplos amanhecer. O sol nasce em posições, brilhos e calores diferentes. Há lugares em que nem nasce. E há, quase sempre, uma revoada de pássaros a brindar o seu surgimento.

Surgiram sete linhas escritas no papel. Os mentirosos dizem que sete é o número da mentira. Ouvi outros dizerem que é o número perfeito. Outros me disseram que a constelação Órion é a morada de Deus, já que estamos falando em perfeição. Alguém dissera que Deus morreu. Outro que Ele não morreu, e sim a esperança de alguns em um Deus que não seja eles próprios. Para alguns Ele nunca “nasceu”. Já nós, nascemos nus e vazios. Quem nos encherá e de quê? Seremos como a árvore de folhas secas ou viçosas? Com flores e frutos ou sem estes? Os filhos são apenas flores, frutos são o que oferecemos a eles e ao mundo.

(Puxa! Surgem mais sete linhas.) No mundo existem coisas interessantes. Uns voam, outros nadam, outros caminham, outros se arrastam. Falo dos bichinhos! Cobra, minhoca... Muitos já me disseram que queriam ser uma águia. Altiva, serena. Passarinho não, porque voa baixo e são devorados. Mas, águia come cobra viva. Seria saboroso o gosto das serpentes venenosas? Um forte veneno foi muito aproveitado, num passado distante, para se beber quando só dores e sofrimento eram companheiros no leito ou por grande desilusão amorosa. Não aconteceu assim a Romeu e Julieta? Sete de novo! Sorrio satisfeito com a inspiração tomando forma.

Inspiração é um bichinho complicado. Ele, às vezes, vem coçando os miolos e crescendo no peito, incomodando até sair. Sai como escultura, tela, poesia, texto... Paridos tantas e tantas vezes quantas forem possíveis. Isso traz alívio e um sorriso de satisfação no pai ou mãe. É claro que uns nascem mais belos que outros. Uns dão bom dia aos passantes, sorriso acolhedor na face. Outros são mais ríspidos, contundentes. Mas, muito necessários, apropriados para certas situações. Preciso parar agora, pôr o bichinho complicado para dormir, até ele voltar a despertar e me acordar de novo da minha letargia vivencial.

Alberto Magalhães.

domingo, 11 de novembro de 2012

Desencontro

Um grande erro é pensar que a mulher tem mais gosto pelo diálogo que o homem, no relacionamento conjugal. O que se nota é que a mulher tem interesse em que o homem escute sempre tudo o que ela tem para falar, e que a iniciativa e a condução da conversa sempre fiquem ao seu encargo. No entanto quando chega o dia do homem criticar, ela sempre fica na defensiva, numa posição de vítima na abordagem. A mulher geralmente se acha atacada e se ofende por comentários comuns feitos pelo companheiro, geralmente considerando-se desvalorizada na relação. Por isso as conversas entre os casais são sempre mais desgastantes psicologicamente para o homem, o que o faz se esquivar dessas conversas na maior parte das vezes. Já para a mulher o comprometimento nessas discussões é mais emocional, o que faz o homem geralmente se sentir frustrado e às vezes até com sentimento de culpa. A mulher geralmente guarda ressentimentos em desfavor do companheiro por tê-la feito “sofrer” desnecessariamente. E depois de tantos mal entendidos, intolerância, ressentimentos equivocados, falta de perdão o relacionamento acaba sem mais sentido. Quem, com honestidade, aponta os erros no relacionamento se importa com a questão, quer a solução da demanda, quer melhorar a convivência. Nem sempre alega com o intuito de acusar, desvalorizar, agredir.
Uma das falhas do ser humano é rotular o outro por uma característica marcante em sua personalidade e passar a deduzir que tudo o que ele fala ou faz é decorrente dessa única característica. Isso é um erro, porque as outras características desse indivíduo em tela, somadas e em prevalência em certo momento definem muitos de seus gestos e condutas. Ninguém é só controlador, ou arrogante, ou insensível, ou interesseiro todo o tempo. Existem coisas que a pessoa é capaz de fazer que não tenha origem só no seu “lado personalíssimo preponderante”. Essa visão fixa de uma característica forte numa pessoa faz com que se veja as suas iniciativas tão somente por esse ângulo, se construindo impressões sempre negativas, já que a visão que as pessoas adotam como uma característica que define uma pessoa é sempre aquela que incomoda ao observador e nem sempre é a característica principal da pessoa observada.
Uma das coisas que serve de ingrediente para a falta de entendimento nas questões aqui abordadas é que em verdade o ser humano (ente conjugal) não tem condições de suprir todas as carências ou de administrar decisivamente as deficiências do outro. Acontece, por vezes, que no momento em que um vai desprender carinho e atenção para o outro, este não está disponível por alguma razão. Não tem tempo, disposição física, emocional e/ou psicológica naquele momento. Embora esteja longe de abrir mão disso no restante das oportunidades. Mas a pessoa que ofertou aquela benesse sente-se injustiçada, quando não desvalorizada ou não amada. Isso cria insatisfação em uma das partes que certamente vai atingir a outra e criar uma instabilidade emocional e psicológica em ambos. Ocorre que na hora em que a parte inocente na questão (suscitada no interior da pessoa contrariada) estiver a esperar a resposta afetiva do outro, ela não vai chegar ou vai chegar distorcida, incompleta, vazia de verdade, insuficiente. Dolorosamente frustrante.
Então estará instalada uma verdadeira crise entre ambos, permeada por dúvidas, sentimentos de desamor, desconfianças. A autoestima será em parte esvaziada, dando lugar para se ocupar esse espaço com o orgulho, disfarçado de amor próprio.

Alberto Magalhães

domingo, 3 de junho de 2012

A mulher seletiva

A mulher, sem saber, apaixona-se por um homem só para depois conhecer a sua mais prodigiosa vocação e paixão: ser mãe. Gerando assim um prazer inato, completo, permanente que não depende do outro para existir. Só dela mesma. A mulher tem na maternidade seu ponto humano culminante, a excelência de suas funções que são tantas e especiais. Na colonização do Brasil a mulher não procriou com os índios e com os negros considerados, na época, como sub-raça, inferiores aos brancos. A mulher agia assim numa atitude de seleção fisiológica, cultural, social, etc. Também, pragmaticamente, as mães procuram as condições de segurança econômico social para o seu filho. No entanto os homens se relacionaram sexualmente com as índias e com as negras e geraram muitos filhos, num processo antropológico de se auto afirmar e de se perpetuar.

É interessante descobrir que mesmo a mulher que pratica a infidelidade contra aquele homem escolhido para gerar a sua prole repudia conceber do outro, e isso não se dá só por questões familiares e culturais. No caso da geração de filho com outro homem, quando não acontece casualmente, há nessa relação a intenção de substituição do parceiro anterior por outro considerado superior nos aspectos insertos nos valores dessa mulher ou de igual capacidade, encerrando-se uma convivência já minada por elementos contrários e começando uma nova.

A mulher, inconscientemente, procura no corpo do homem a oportunidade de reprodução e prazer, nessa ordem. O instinto de reprodução é muito mais forte na mulher em virtude de ser ela quem procria: gera e concebe. Ela antropologicamente vislumbra no parceiro escolhido o potencial de qualidades - inerentes aos seus peculiares instintos maternos -, para o seu rebento.

Os homens, ao contrário da mulher, não têm na reprodução da espécie o instinto/intuição da qualidade da prole, na sua fisiologia ou na sua aparência. O homem, historicamente, se interessa mais pela quantidade da prole e na autossatisfação sexual imbuída no ato de reprodução.

A maternidade, o instinto reprodutor é uma força natural descomunal num ser fisicamente frágil, concebendo ininterruptamente para fazer toda a humanidade existir. A mulher protege o corpo do seu filho à custa da sua própria vida. Porque agora – depois de conceber -, a sua vida já não lhe pertence. Na prática torna-se o inverso: a quem ela deu a vida, entrega a sua.

Àquelas a quem não foi dado o privilégio de fecundar e gerar vida, Deus consola no mistério dos seus desígnios.

Autor: Alberto Magalhães

quarta-feira, 14 de março de 2012

Acredite na vida

Acredite na vida
Acredite na fé que renova todas as coisas
Acredite que você será sempre capaz
Capaz de realizar os seus bons desejos e os seus melhores planos
Acredite que o amor existe e cura as pessoas da solidão
O mundo também é feito de crianças e flores, de inocência e perfume
Pense que o sol e a chuva, o ar e as estrelas são para você
Respire o ar para viver e contemple as estrelas para sonhar
Sinta a luz calorosa do sol, o frescor da água e o brilho radiante dos astros nos revelando que há um caminho a seguir
A lua será o bibelô para enfeitar as suas noites
E a brisa passará para acalentar o seu sono
Alguém lhe deu um mundo de cores, de vida, de transformações e de oportunidades
Existe alguém precisando do seu abraço, mesmo que você nunca tenha recebido um
Acredite que o que você espera e ainda não recebeu está guardado para você
Para completar o presente mais saboroso e valioso que você já ganhou: a vida.
Então a alegria virá permanentemente para preencher cada seu novo dia.

Alberto Magalhães

domingo, 29 de janeiro de 2012

Conte-me sobre você


(para quem estiver pensando em fazer a tolice de se separar de alguém importante)

Conte-me coisas boas a seu respeito. Que você está bem, quase feliz. Conte-me que está se ocupando com algo de que gosta de fazer. Que passeia e se diverte. Que tem amigos leais. Que alguém lhe ama especialmente. Que se lembra dos bons momentos que tivemos, e dos engraçados, e sorri.

Conte-me coisas boas que têm lhe acontecido, as ruins deixe no mar do esquecimento. Não posso mais lhe confortar. Quero lhe imaginar sempre de semblante tranquilo e sorriso no rosto. Com cabelos ao sabor do vento e um batom suave nos lábios. E quase sempre com aqueles olhares de menina sapeca, que disfarçam seus trinta anos de vida.

Conte-me que no natal passado mandou-me um cartão de boas festas e que não chegou por culpa do carteiro. Que numa das suas orações se lembrou de mim para me abençoar. Que várias pessoas das suas novas amizades, embora nunca tenham me visto, conhecem-me de lhe ouvir falar. Mais as minhas virtudes que minhas falhas. Que pensou por várias vezes em voltar, mas sabe que o seu espaço já está ocupado, mesmo que não no coração, que sempre terá você num cantinho sagrado, a dizer quanto foi – e é e será -, importante.

Conte-me que um dia desses sonhou que se encontrava comigo, cada um com uma dezena de filhos ao redor e que brincavam juntos, como se fossem todos irmãos, os filhos que juntos não tivemos pela desistência mútua de se entender.

Conte-me que há muito já me perdoou e que se pudesse voltar no tempo nunca teria partido. Que eu lhe direi que você nunca partiu de verdade, que está bem viva aqui em algum lugar dentro de mim a esperar a porta se abrir completamente para então tomar conta de tudo.

Alberto Magalhães

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Um pedido no natal

22 de dezembro de 2011

Eu sou natural de Bagdá, onde há poucos instantes ouvi um estrondo de uma bomba que explodiu próximo da minha casa e soube que muitas pessoas morreram e membros foram separados dos seus corpos. Eu não fui ver, ainda sou criança e tenho medo.

Repentinamente eu fui transportado em pensamento para a periferia do Rio de janeiro onde uma adolescente foi atingida por uma bala perdida e depois para Moçambique onde havia os corpos de crianças mortas pela fome, deitadas na poeira da estrada por causa da guerrilha perversa, causada pela ambição insana de poder. Vi nos Estados Unidos uma mãe jogar um bebê no fosso porque estava desempregada. E fui girando e vendo pelo mundo cenas de terror.

Na minha casa não comemoramos festas natalinas, não reverenciamos Jesus nem esperamos o papai Noel vir do céu para nos trazer algum presente. Nada disso me ensinaram, eu vi na internet.

No entanto, nesse momento eu pensei nessas coisas. E orei a Alá: Senhor eu gostaria que nos mandasse um papai Noel. Um mensageiro celeste. Alguém que trouxesse no saco uns ensinamentos com uma ordem no final: “cumpram, para o bem de todos.”

Que dissesse que o amor, a fraternidade, a solidariedade, a compreensão, a compaixão eram elementos essenciais para que, depois de considerado aprovado, o cidadão recebesse um documento (mesmo aos cinqüenta anos) intitulado “adulto”, apto ao emprego, ao casamento, ao mandato eletivo, a herdar a herança deixada por seus pais...

Que dissesse que o título de adulto fosse anulado a partir do dia que o cidadão voltasse ao estado anterior. Anulando automaticamente todos os direitos concedidos.

Que garantisse à criança realizar sonhos como crescer saudável física e psicologicamente. Ver os pais só “dormirem no seio da terra”, bem velhinhos, quando seus netos tiverem crescidos em seus colos. Deixar as crianças, antes de extinguir o seu tempo por aqui, plantar muitas árvores, ler muitos livros, casar com a(o) namorada(o) da sua infância, viajar para vários lugares e saborear outras culturas, poder viver sem medo e sem conviver com a violência. Que cada um pudesse escolher uma profissão desejada, para ser útil a todos e assim também ter tudo o que precisa.

Que a paz seja o sonho de todos, o bem maior, porque ele preserva todas as vidas.

Ligo o computador e peço isso diretamente a Alá pelo Google. Lá encontro uma resposta ao meu pedido: Deus já enviou à terra esse papai Noel. Deram-lhe o nome de Jesus.

Alberto Magalhães

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O desejo realizado

As pessoas almejam obter ótimos empregos, altos cargos, polpudos salários, empreender grandes negócios, possuir todos os bens de consumo disponíveis no mercado, imóveis bonitos e confortáveis, querem estar muito belas, com seus corpos em forma, rijos, “sarados”, cabelos e pele viçosos, brilhantes ansiosas por agradar ao mundo e serem agraciadas por ele. Querem ser bem sucedidas em tudo o que o seu coração deseja. Mas mesmo as pessoas que conseguem isso nem sempre conseguem conhecer o sentimento de realização plena, de felicidade alcançada. Como se o espaço interior da realização pessoal fosse um vazio incomensurável. Temos o exemplo da atriz americana Marilyn Monroe, que apesar de linda, famosa, rica, desejada e admirada no mundo não se sentia feliz e teve um final deprimente. Elvis Presley, Michael Jackson, Amy Winehouse, entre tantos que não conseguiram encontrar felicidade na realização pessoal física, financeira, social, profissional. Parecia que quanto mais realizavam seus desejos mais definhavam na frustração de superar a sua condição de pessoa vulnerável, frágil, fisiologicamente comum.

Pareciam demonstrar que quando prosperavam e ocupavam todos os espaços que podiam ficavam limitados, tolhidos, deficientes, engessados na sua própria condição humana que não lhes permitia subir além, transcender, ser nada mais do que já eram. E havia tantos artistas, tantas beldades, tantos talentos em cada área em que eles se destacavam. Embora a soma dos seus talentos e qualidades não os fizessem sentir-se realmente especiais e plenamente realizados. Precisavam agora galgar um nível de excelência que outra pessoa ao seu redor não tivesse alcançado.

A realização de um desejo é a sua morte, ou seja: quando realizamos um desejo o matamos e então fica essa sede interminável de realizar outros desejos e vamos desprezando o que já realizamos, anulando-o como valor elementar ou pondo-o em segundo plano e abandonando ou negligenciando a nossa responsabilidade com o que foi conquistado, às vezes arduamente, preterindo pessoas que nos são caras e subestimando afetos que nos prendem à estrutura basilar da nossa alma. Lembro-me daquela frase tão comum na minha infância, e tão sem validade atualmente, gravada na traseira dos caminhões: “Não tenho tudo o que amo, mas amo tudo o que tenho.” Epicuro disse que a dor nasce do desejo. Certamente haverá algo ou alguém sublime que preencha esse espaço faminto do homem, esse vazio que parece imenso. Cada desejo a se realizar – com suas consequências -, é um convite para o caminhar fecundo e uma porta aberta para a descoberta do abismo interior.

Alberto Magalhães

domingo, 28 de agosto de 2011

O essencial num estalo

Porque gostas de me ouvir falar em casos fabulosos, em histórias passadas nas ruas e vielas de tempo revolto e de valentia nascida do medo de sucumbir frente ao adversário, sempre a me solicitar a repetição de cenas cruas e pujantes nunca pude discorrer sobre coisas mais relevantes ou simplesmente mais tenras e humanas – não heroicas, dividir percepções fecundas, teorias conflitantes, indecisões emblemáticas, experiências edificantes e superações.

Por isso eu preciso escrever, só assim eu sobrevivo à sombra da razão e me eternizo nessas linhas que ficam para a posteridade, testemunhas da vontade de superar o artificial. Porque alguém disse que é necessário escrever para reinventar o mundo ou até mesmo escrever como se nada mais restasse no mundo a não encher a alma de poesia. Para exorcizar a nossa mediocridade e assim, quem sabe num estalo, desfazer os conceitos hipócritas, preconceitos concebidos, dogmas estabelecidos e os sofismas delirantes. Talvez curar essa falsa lucidez mesquinha e emocionalmente danosa que impede o ser real emergir das profundezas do seu egocentrismo e conseguir encontrar as mais belas qualidades no fundo da sua alma, junto com os defeitos que o acompanham.

Talvez não seja tão difícil conseguir se escrevermos numa folha colada na porta da saída de casa, para lermos todos os dias: Na vida temos o mundo a descobrir, a amizade para distribuir, a alegria para sorrir, a felicidade para conquistar...

Alberto Magalhães

domingo, 12 de junho de 2011

Por quem os sinos dobram

Prossigamos despidos de todas as amarras que nos prendem aos nossos ensinamentos rudimentares e paradigmas “engessados”. Façamos como Ernest Hemingway no seu livro “Por quem os sinos dobram”, sabendo discernir entre todos os lados. Entre o bem, o mal e o neutro (para mim, em última análise, o neutro é o mal ao avesso – mas não se importem muito eu passei a ser um inveterado questionador. Os tolos chamam a tais, “rebeldes sem causa”- e os tolos porventura entendem de causas?).

Façamos o seguinte: hoje, questione sinceramente as suas convicções com as outras opiniões e ao final com os fundamentos práticos e subjetivos dos nossos ascendentes (tão menosprezados por essa geração de pessoas superficiais, vazias e limitadas) e sempre defenda, com firmeza, seus pontos de vista que sejam coerentes com seus princípios reformulados por você.

No âmbito geral o que hoje é (na aparência) talvez não o seja de verdade. O que ontem foi (algo de ruim ou de bom), talvez agora não seja mais. Pensem, questionem esse mundo indutor, busquemos agora as razões primeiras – não aquelas nos transmitidas nos redutos que nos cercam por pessoas maquiavélicas e pequenas , desprovidas de um mínimo de espiritualização positiva – nuvens sem água, que o vento da verdade em pouco tempo deteriora.

Alberto Magalhães

(POR QUEM OS SINOS DOBRAM - Acima de tudo o livro trata da condição humana. O título é referência a um poema, e invoca o absurdo da guerra, como a guerra civil, travada entre cidadãos de um mesmo país. "Quando morre um homem, morremos todos, pois somos parte da humanidade”/ Fonte: wikipedia). Alberto Magalhães

sábado, 14 de maio de 2011

Um alguém

Para me fazer rir sempre. Para dormir enroscada comigo. Para dizer que se sente segura ao meu lado. Para ser capaz de andar comigo no teleférico, mesmo tendo medo de altura. Para, de vez em quando, bisbilhotar o meu celular, bolsos e pasta. Para dizer: “se eu te pegar com outra, eu te deixo”. Para fazer os meus gostos nas horas certas. Para fazer eu me sentir a pessoa mais importante do seu mundo, mesmo que este seja modesto. Para se despedir com um: “cuidado!...” e me receber de volta com um simples e carinhoso abraço. Que tenha o prazer de me esperar para almoçar comigo, quando a fome não for enorme. Que eu seja o seu único e exclusivo amor, mesmo não tendo sido o primeiro. Que se aflija no dia em que eu tiver forte febre e seja a minha enfermeira. Que no dia em que, por algum motivo, se decepcione comigo seja capaz de apenas dizer: "a partir de hoje eu não vou mais amar você". E, se depois eu trocar tudo pelo seu amor, ouvir: “eu vou dar a nós dois uma chance”. Que esconda as minhas falhas da minha – e da sua - família. Que goste dos que eu gosto e despreze os que eu não gosto. Que me deixe enxugar a sua lágrima que eu fiz cair. Que, carinhosamente, atribua a mim os pequenos defeitos do nosso filho. Que, só comigo e com os que me amam, ria das minhas gafes. Alguém que seja capaz de me dizer as verdades que eu preciso ouvir, sem me fazer sentir-me um caso perdido. Que, silenciosamente, espere receber tudo isso de volta.

Alberto Magalhães

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Tragédia em Realengo

Talvez não seja muito difícil fazer uma leitura do evento ocorrido na escola Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro. Essa é uma tentativa de se adentrar nos meandros da mente do assassino Wellington e descobrir as suas razões, mesmo que equivocadas. Ninguém faria um ato bárbaro desses se não tivesse movido por fundamentos incontestáveis, sólidos na sua mente delirante. Para iniciar devemos observar que mais eventos como aquele não acontecem no mundo apenas por falta de oportunidade para o pretenso executor promover o atentado como, por exemplo, a impossibilidade do pretendente juntar os seus “algozes” no mesmo lugar, ou tê-los juntos no mesmo tempo e espaço, como aconteceu nas escolas que sofreram esses ataques, mundo a fora. Certamente Wellington se achou no direito de “punir” os seus “inimigos” que o haviam tratado com desnecessária insensibilidade, desprezo e desrespeito por anos. Atos socialmente impunes. Ele não considerava o seu projeto o de um louco ou de um monstro, mas de um “justiceiro”. Quem lê a bíblia e torna-se um fundamentalista, como ele muito bem demonstra, prega que Deus pune os “ímpios” com a morte e alguns se acham no direito de auxiliá-lo nessa tarefa, como se fossem um anjo da morte. O seu antecipado pedido de perdão ao Divino, em carta, não foi exatamente por causa das mortes que iria causar, mas da sua própria vida que iria deliberadamente encerrar naquele ato. De alguma forma esse tipo de pessoa considera-se “superior” aos seus desafetos, acha-se espiritualmente “iluminado”, por considerar-se incompreendido, injustiçado, perseguido e, portanto, especialmente acolhido pelo Ente divino. Na sua caminhada à escola Tasso da Silveira ele pode ter se sentido um herói, um justiceiro dos fracos, oprimidos e humilhados, dos incompreendidos, rejeitados, diferentes.  A preferência dele em executar as meninas pode ter se dado porque elas “podiam” e “deviam” ter-lhe sido solidárias e favoráveis, por serem mulheres, portanto sempre mais sensíveis e compreensivas. Ele certamente considerava-se um cidadão honrado, virtuoso, digno... E a cultura atualmente assimilada pela juventude feminina é a da sensualidade pura, da qualidade física e a de recepcionar, preferencialmente, o descolado, o transgressor, o despojado de valores éticos e morais e que interage com todos os segmentos pragmáticos. Tudo o que ele não era. E só elas, ao menos uma, poderia lhe ter reabilitado frente a eles. Se alguém teve a vontade para isso não teve coragem suficiente de se indispor contra a horda adversa. A sua solidão teria se tornado interiormente devastadora. No seu gesto extremo ele tentava sair da insignificância que lhe submeteram para a notoriedade dramática, correspondente ao seu dilema: ser mais um anônimo humilhado e preterido ou ganhar relevante projeção exatamente por meio daqueles que o jogaram para o fundo do poço? Ele era muito desajustado e a sua tentativa de sublimação veio num ato que não era só de ascensão, mas um misto de superação, vingança, justiça, catarse. O seu encontro com a libertação desse peso angustiante seria o encontro com a morte. Talvez, se pudesse, a de todos.
Alberto Magalhães

domingo, 27 de março de 2011

Libelo do ato ímpio

Recentemente eu escrevi um texto denominado “Carta a um amigo”, o qual está postado neste blog. Pois bem, isso não foi por acaso, como por acaso – dizem – nada acontece. Um colega de trabalho naquele momento pensava em tirar a própria vida por questões financeiras e outro por questões amorosas. Tudo transcorria dentro deles numa dimensão superior ao real – mas não pra eles. Para eles tudo teria chegado ao ponto final, nada mais estava importando por aqui. Mas as pessoas ao seu lado não se apercebiam da gravidade, para eles, dos seus dramas pessoais. Até que conversaram comigo. É interessante como tem pessoas que pensam que eu, geralmente, vivo como se estivesse no limite da perspectiva vivencial. Provavelmente eu demonstro isso sem me aperceber. Talvez em virtude disso eu seja receptor de tantos segredos que guardo a sete chaves. Pois bem, conversei com eles sobre experiências pessoais e outros fatos interessantes que contemplei na minha breve caminhada nesse mundo enganador. E, em síntese, de tudo o que conversei, relatei nesse curto texto – Carta a um amigo – a mensagem que servia de epílogo ao objetivo  pretendido. E como eu não tenho como ter acesso – embora gostaria –, pelo menos, aos dilemas cruciais das pessoas que estimo e que estão passando por uma grave crise existencial eu resolvi escrever – das minhas paixões, a maior – sobre parte do que eu disse aos pretendentes ao suicídio:

Eu lutei no útero por uma oportunidade de sobreviver, mesmo que fosse com outro(s). Cheguei só. Sobrevivi à formação do embrião, do feto, ao parto, à frustração de sair de um mundo aconchegante e só meu para a luz desse conturbado mundo. Retirado do casulo para ser entregue nas mãos de estranhos que me puxariam para outra realidade que não escolhi e onde seria apenas mais um. Sobrevivi a impiedosa asma nos primeiros anos, ao sarampo, rubéola, catapora, a uma queda de uma árvore de dez metros de altura aos oito anos, a um afogamento aos treze, e – já adulto - a três acidentes automobilísticos graves e sobrevivi a muitas outras situações que levaram outros a óbito.

Não tenho, no entanto, nenhum apego à vida já que ela, na verdade, não me pertence visto que dela não tenho o domínio, mas apenas a posse provisória. Mas também não posso renunciar a ela. Esta primeira vida é uma missão, na qual plantamos algumas ilusões e colhemos dores. Eu, naturalmente, desafio a morte a cada dia que vivo, desde o início da gestação. O corpo é apenas a morada efêmera de um espírito intocável pelas almas sebosas. Mas ai daquele que um dia desencarnar um espírito injustamente, mesmo que seja o seu. Esse ser que se põe como juiz do destino do próximo – ou de si - não é um instrumento do Criador, mas um ser que lhe é adversário. Se eliminar o outro desse plano, injustamente, é um ato ímpio o que não será eliminar a si próprio? Não há justiça nesse propósito. Nele não há fé, não há amor, não há esperança, não há virtude, não há proveito, não há honra.

Alberto Magalhães

domingo, 20 de março de 2011

Deus

De repente tudo parece ser ilusão, fantasia. Família, amigos, amor, ódio, honra, dever de ofício, sonhos, ideais, corpo, vida, morte. Tudo o que de profundo se relaciona com os tais passa a aparentar ser fantasia da mente e se desfará como a neblina ao amanhecer. Deus, esse ser tão magnífico e, por vezes, distante, inalcançável, é a verdade que nunca se apaga e uma chama que não se extingue dentro de mim, a me revelar cruamente para mim mesmo. Ultimamente mata-me aos poucos, sem me destruir. Confunde-me nos meus caminhos, me transtorna sem me enlouquecer. Consome-me sem me aniquilar. Revolve-me completamente, sem me tocar um dedo. Porque na minha omissão eu não mais aborreço os ímpios. Ainda assim Ele me ampara e me protege das forças ocultas. Embora me subverta contra mim mesmo, é quem dá sentido aos meus dias e me faz rir dos poderosos. Por vezes transborda-me de profunda dor ou imenso prazer...       

Alberto Magalhães
  
                                                     

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O corpo e as sombras

Uma sombra estava bem próxima, ao meu redor. Discreta, sutil, quase imperceptível. Ela não me apaziguava, nem me transtornava. A não ser em momentos de convulsão emocional. Nesse momento me sublevava. Ela não me guiava, mas sempre me acompanhava por mais que eu não quisesse e a desprezasse. 

Na paz, na espiritualidade ela sumia. Na vida mundana ela sempre aparecia. Ela não procurava me aniquilar, mas me subverter, manipular e dominar o que afinal é a mesma coisa. Eu a ingeria alma a dentro na cerveja gelada, na fumaça morna, no sexo profano, na futilidade mental, na mágoa adormecida, na maldade perpetrada.

As sombras se conhecem  e se comunicam, mas não conhecem os humildes de espírito. Não os incomoda. Antes, são por eles anuladas. Essas sombras estão por ai a gozar privilégios e espaços cada vez maiores no mundo materialista, individualista, egoísta, egocêntrico.

Sombras que minam o amor verdadeiro, construtor, redentor, pacifista. As sombras riem dos homens, das suas vulnerabilidades, das suas aspirações, das suas tragédias, das suas dores e da sua infelicidade. E nos enchemos de sombras atraentes, ofuscando o sol primitivo dos nossos corações.

Alberto Magalhães

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Dois contos


Uma figura folclórica

Seu Zé era uma figura folclórica da minha infância. Ele morava na rua das casas, número na porta, como dizia. Ele era ranzinza e irreverente. Sempre falava, principiando qualquer conversa: “o negócio é o seguinte: dezenove não é vinte, mas tem um porém: noventa não é cem.” Ele conversava muito e quando alguém lhe fazia alguma pergunta que não sabia responder, dizia: “acredito que sim, creio que não, porém não sei”, encerrando o assunto. Do seu neto, ele dizia: “sapeca? Aquele já pintou o sete, riscou o oito, desenhou o nove e apagou o dez.” Se o menino, suado, pulava em seu colo ele logo dizia: “vá tomar banho que você tá com cheiro de cachorro novo.” Ao filho, aconselhou no dia do casamento: “todo dia quando chegar em casa, dê uma surra na mulher.” Diante da surpresa do seu filho, ele lhe esclareceu: “você poderá não saber porque está batendo, mas ela saberá porque está apanhando.” Ainda lhe disse mais: “a mulher tem dois direitos: o 1º é saber que não tem direitos nenhum e o 2º é não abusar dos direitos que tem.”  Mas nada  disso era de verdade, ele não era mau, era apenas um gozador. Ele disse que, na mocidade, esteve se formando em engenharia até que o seu patrão  vendeu o engenho. Sobre um vizinho que, depois de sofrer um acidente automobilístico, passou a ter uma perna mais curta que a outra, ele saiu com essa: “quando Deus aleija é pra não perder de vista.” Todo final de tarde ele ia na bodega do seu Manoel, tomar um cafezinho, fumar um charuto ou cigarro de palha e jogar conversa fora. Pra irritar seu Joaquim, um senhor preto e seu quase desafeto, assim ele pedia café todos os dias: “ me dê um preto, passado no saco.” No dia em que o café não estava “no ponto”, ele comentava: ”tá com gosto de cuscuz de cinza.” Quando ele chegava na rodinha dos aposentados, sempre gracejava: “Soldado, sem farda, sem companhia, chegando da putaria, se apresentando pra trabalhar.” E quando ele terminava de contar uma fofoca, completava: “é o mundo todo pra falar de mim e eu sozinho pra falar do mundo todo.” Quando ele se despedia de nós, mais jovens, sempre dizia: “quando for dormir, feche os olhos. Quando acordar, abra!” A sua ausência casual era logo sentida por todos. Realmente era uma grande figura o seu Zé.

Alberto Magalhães

O cabrito roubado

Naquele aprisco só havia um cabrito e uma ladra o roubou. Ela não era uma ladra comum e aquele não era um cabrito qualquer. Ele havia gerado uns cabritinhos e neles depositava os seus cuidados. Os conduzia aos campos e aos alimentos que lhes sustentavam com saúde. Também lhes oferecia carinho e atenção. Ele era o guardião daquele aprisco. Com ele por perto tudo parecia menos inóspito e inseguro. Ali também havia uma cabrita que o auxiliava e compartilhava de tudo que o cabrito fazia. No dia em que a ladra chegou ela não chegou com estardalhaço. Nem com agressividade ou coação. Não! Ela chegou de mansinho, com um sorriso no rosto e braços abertos para abrigar qualquer desprevenido. E aquele cabrito se maravilhou de que houvesse mais um abraço para o abrigar nas suas fantasias. E logo se acostumou com aquele novo abraço que trazia um perfume suave e sedutor. Aquela ladra não roubava pertences ela roubava apenas corações, mas com tudo o que havia nele. Um dia ele a seguiu, não se sabe ainda pra onde, e não mais voltou.
Agora, sem ele, aquele lugar não parecia mais um aconchegante aprisco, um lar, mas apenas, um simples abrigo. Todos os dias a cabrita se fazia várias perguntas. Por onde andaria, agora, aquele cabrito sonhador? O que estaria fazendo? Estaria feliz? O seu coração estaria sentindo falta daqueles campos verdosos e pacíficos e dos que lhe amavam? Se importaria ele em saber como estariam aqueles que ele havia deixado? Estaria abrigado do frio e da chuva, como aqui estivera, cercado de cuidados? Como estaria aquele cabrito que fora daquele aprisco, um dia? 

Alberto Magalhães

domingo, 26 de dezembro de 2010

UM ESTRANHO AMOR

Ele era um cara especial para quem o conhecia. Eu tive o prazer de ter a sua amizade. Ele tinha uma dedicada esposa e um casal de filhos e era por eles amado. E os amava profundamente. A sua morte nos deixou uma triste saudade. Um infarto o levou de nós. Um coração como o dele deveria viver para sempre. Ele era natural de São Paulo e viveu mais de vinte anos aqui em Sergipe, desde os seus trinta e poucos anos. No jardim da sua casa nós bebíamos cerveja brahma e conversávamos sobre todas as coisas do mundo, enquanto os cantores da MPB cantavam pra gente. Ele revelava humanidade em todos os seus gestos.

Eu o velei e o enterrei com lágrimas nos olhos e aquela sensação de uma grande perda, que só sentimos quando as pessoas que realmente temos se vão. A sua esposa e filhos ficaram inconsoláveis. Algum tempo depois da sua morte ela me confidenciou que ele não podia gerar filhos. Ela me disse que, apesar disso, o seu sonho era ser pai. Mas eu mesmo a tinha visto grávida ao lado dele por duas vezes e até acompanhei os passos das duas crianças – menina e menino - cuidadas por ambos. Os filhos ela havia gerado com outra pessoa e os ofertara a ele fingindo para o outro que eram do seu marido. Eram de um amante que ela visitava esporadicamente com o intuito de procriar, com a permissão dele.  Ele não queria adotar bebês, preferia que os filhos fossem  a extensão dela. Ele não queria tirar dela esse direito. O  pai amoroso seria ele.  E foi. Ela também revelou a verdade aos filhos. Pouco tempo depois do funeral deixaram a nossa terra, onde  ele havia escolhido para viver até a sua morte. Recentemente ela faleceu, em telefonema um dos seus filhos me disse que foi de tristeza, que nunca a deixou.

Quem conheceu o casal percebia que um amor mútuo os unia. Um profundo, especial e estranho amor. 

Alberto Magalhães

domingo, 19 de dezembro de 2010

Neste natal,

Agradeça a Deus por cada coisa que você tem, antes de ficar insatisfeito pelo que ainda não adquiriu;

Retribua com alegria aos que estão sempre ao seu lado, antes de maldizer aqueles que te ignoram ou abandonaram;

Calidamente se apaixone pela vida, suavemente namore com ela, dance com ela gentilmente na lua que ilumina a noite, antes do silêncio inevitável;

("Se você não tem virtudes, assuma alguma". Shakespeare)

Feliz natal! Ano novo de paz.       

Alberto Magalhães

sábado, 11 de dezembro de 2010

Carta a um amigo

Os dias são mais tristes que alegres. As estradas são longas para se alcançar os objetivos e um vento qualquer, às vezes, nos tira o que arduamente alcançamos. Também as coisas e as pessoas  que conquistamos nunca são exatamente como pensamos ou  queremos. Talvez sejamos muito exigentes ou perfeccionistas com relação a algumas coisas. As promessas que no mundo surgem não são completamente reais, mas têm o condão da inspiração de nos fazer viver mais intensamente a vida.

Quando se pensa que se está chegando às estrelas da realização e elas se dispersam feito nuvens de verão, não se deve definitivamente se abater. As quedas não não são o fim, mas o encerramento de um caminho e a oportunidade de um recomeço ou, talvez, a reprovação de uma matéria da escola chamada mundo com direito a recuperação. O conjunto deve importar mais que a unidade, seja a que for. Devemos alimentar esse princípio.

A vida é mais esperança que felicidade, para ser o incentivo da caminhada. Pense nisso.

Alberto Magalhães

domingo, 17 de outubro de 2010

O mundo não está melhor

Diante de notícias ruins à nossa volta sempre ouvimos comentários que as coisas estão piorando. Na verdade o mundo não muda pra pior nem pra melhor, fica no meio. Ele caminha nas duas direções. Oscila tempos mais para um lado, tempos mais para o outro. Exemplos de períodos piores foram os das grandes guerras, como os 1º e 2º conflitos mundiais e os de outros anteriormente de igual magnitude para a época que não são computadas, dessa forma, pela história moderna. Invasões de pequenas nações, transformadas em colônias, por outras mais poderosas. Também as grandes epidemias que a saúde, de vários países, sofreu. Crises econômicas e políticas que implantaram, quase ao mesmo tempo, ditaduras governamentais pelo mundo. 

Na outra vertente estão as descobertas de vacinas imunizantes, a libertação de nações do jugo de outras, a democratização de países dominados por militares, o avanço da informática e tecnologia, a ampliação dos direitos humanos no mundo... No entanto, quando menos se espera, algo de ruim surge para a humanidade, como as guerras, por exemplo, sempre originadas por interesses políticos ou econômicos que, ao final, são a mesma coisa. Os americanos saíram do seu continente e - à pretexto de combater  o narcotráfico - instalaram uma base militar na Amazônia e estão se apossando da parte brasileira com seus dólares manchados de sangue oriental.

O mundo caminhou para melhor e para pior, desfruta de uma cultura cíclica de melhora em umas áreas e piora em outras, alternando evolução e atraso. Exemplo disso, atualmente, são o avanço incontido das drogas entre a juventude, da AIDS, a eminência de esgotamento dos recursos naturais e da dilapidação da natureza, a crise familiar, o aumento da criminalidade urbana...

A educação, a cultura, as artes, a igreja, os movimentos sociais progressistas sempre tiveram a capacidade de avivar a consciência individual e coletiva para a preservação dos valores fundamentais da pessoa humana. Sem esses elementos racional espirituais estimuladores da boa consciência humana os homens seriam seres puramente egoístas e perversos. Eles também sofrem essa oscilação cíclica. Esses elementos, associados a um inconsciente e essencial instinto de sobrevivência em grupo, contribuem para a boa convivência da espécie humana. 

O mundo sempre estará melhor e pior para o homem, graças a ele próprio.

Alberto Magalhães

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O culto ao efêmero

Vivemos num bom tempo. Hoje tudo é mais fácil. No entanto tudo é efêmero, corrido, descartável. Não é por culpa da internet, ao contrário, ela é um produto do homem moderno: múltiplo, insatisfeito, superficial. Não mais se busca, como antigamente, o herói mitológico, ideal, paradigmático. Morreram Martin Luther King, Ghandi, Tiradentes.... mas agora não só fisicamente, morreram definitivamente.  Nessa geração Coca-Cola, aficionada pela mídia que canaliza o estrelato para qualquer um – nos realitys shows da vida -, pela TV, pela personificação – às vezes fascista -, nos twiter, blogs, sites, colunas sociais. Hoje se anula – inconscientemente ou convenientemente -, os grandes nomes de outrora. Para que cultuarmos exemplos de um só homem para intermináveis gerações, se o supérfluo nos domina e o efêmero nos fascina? Eles agora morreram ideologicamente, que é o último reduto da existência de um defunto: o imaginário popular. As elites nos ensinam a amar só o dinheiro, a vanglória e o poder; na verdade, a superioridade vã que esses atributos trazem. Mesmo que tão  ilusória e passageira. Todo homem é dúvidas, fragilidade, carne e finitude sempre deprimente. Oh! Glória vazia! Não existe mais a honra, diria o pensador. Ela tornou-se algo ridículo, desnecessário. A palavra empenhada– outrora digna, hoje é ferramenta de embuste e de trapaça, tornada, aos ouvintes, produto  sem o mínimo valor.

O pensamento é hoje utopia dos idealistas. O pensador, o escritor, o poeta são seres a caminho da extinção, como a fauna e a flora. Vivemos noutros tempos. As músicas e brincadeiras de roda foram substituídos pela TV, games e passatempos virtuais no PC. A literatura e a poesia, pelas imagens sensuais de fotos e vídeos. A profundidade, pelo superficial e imediato. A mulher deixou de ser apenas namorada, profissional, esposa e mãe para ser modelo corporal - produto da cultura sensual -, permanentemente. A única via possível  para a mulher se realizar é a beleza física? A lua e a noite estrelada, o amor eterno, o casamento deu lugar aos relacionamentos curtos, de temporada, em busca de vantagem material ou de satisfação da libido. Os filhos que antes eram os frutos do amor, hoje são a sobra do sexo.

As cidades alimentam a proliferação das drogas destruidoras da juventude, a criminalidade crescente, a corrupção incontrolável. Sacrificou-se o respeito ao semelhante pelo materialismo, pela ambição desmedida. O altruísmo da fé, pelo negócio da fé. Os novos, querendo fazer de seus pais marionetes das suas vontades e, cedo, se ofertando às vontades libidinosas dos outros jovens e dos adultos. 

Vivemos o tempo do sucesso social ou do fracasso, não mais do aprendizado humano, nada mais conta. É o tempo do vale tudo, da indecência, da vantagem. As ideologias sucumbiram ante o capital, o individualismo e a unanimidade pragmática burra. Não temos mais líderes respeitados em nenhum segmento. Estamos perdendo a nossa identidade, o nosso desenho pessoal porque perdemos o senso da verdadeira dignidade e dever social.

A espiritualidade, a filosofia, a literatura, as artes, a música estão definhando, pálidas e distantes do coração.

Alberto Magalhães