quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Escrever

Era um papel branco e vazio. Surgiu primeiro o E. E daí uma frase. A segunda se iniciou com um S. A terceira com um E. E assim foi linhas a fora. Pouco antes, havia dito pra ela: Você está aqui dentro de mim maior que o mundo que eu avisto, ocupando todos os meus espaços. Mas, também existia o horizonte pleno a me convidar para outras caminhadas. Ficar é morrer aos poucos a cada entardecer. Não morrer de verdade, diga-se a bem da verdade, mas é abrir mão dos múltiplos amanhecer. O sol nasce em posições, brilhos e calores diferentes. Há lugares em que nem nasce. E há, quase sempre, uma revoada de pássaros a brindar o seu surgimento.

Surgiram sete linhas escritas no papel. Os mentirosos dizem que sete é o número da mentira. Ouvi outros dizerem que é o número perfeito. Outros me disseram que a constelação Órion é a morada de Deus, já que estamos falando em perfeição. Alguém dissera que Deus morreu. Outro que Ele não morreu, e sim a esperança de alguns em um Deus que não seja eles próprios. Para alguns Ele nunca “nasceu”. Já nós, nascemos nus e vazios. Quem nos encherá e de quê? Seremos como a árvore de folhas secas ou viçosas? Com flores e frutos ou sem estes? Os filhos são apenas flores, frutos são o que oferecemos a eles e ao mundo.

(Puxa! Surgem mais sete linhas.) No mundo existem coisas interessantes. Uns voam, outros nadam, outros caminham, outros se arrastam. Falo dos bichinhos! Cobra, minhoca... Muitos já me disseram que queriam ser uma águia. Altiva, serena. Passarinho não, porque voa baixo e são devorados. Mas, águia come cobra viva. Seria saboroso o gosto das serpentes venenosas? Um forte veneno foi muito aproveitado, num passado distante, para se beber quando só dores e sofrimento eram companheiros no leito ou por grande desilusão amorosa. Não aconteceu assim a Romeu e Julieta? Sete de novo! Sorrio satisfeito com a inspiração tomando forma.

Inspiração é um bichinho complicado. Ele, às vezes, vem coçando os miolos e crescendo no peito, incomodando até sair. Sai como escultura, tela, poesia, texto... Paridos tantas e tantas vezes quantas forem possíveis. Isso traz alívio e um sorriso de satisfação no pai ou mãe. É claro que uns nascem mais belos que outros. Uns dão bom dia aos passantes, sorriso acolhedor na face. Outros são mais ríspidos, contundentes. Mas, muito necessários, apropriados para certas situações. Preciso parar agora, pôr o bichinho complicado para dormir, até ele voltar a despertar e me acordar de novo da minha letargia vivencial.

Alberto Magalhães.