Não exaltei qualidades dos finados nem contei histórias sobre
eles naqueles momentos de pesar. A minha lágrima ou simples expressão de
tristeza, me foram bastante. O silêncio é a maior expressão de pesar e respeito
por aquele que nada mais ouve nem vê. Um abraço confortador no que sofre e a
presença em homenagem ao que parte é elementar no ritual do sepultamento. Naquele
ato, falar em qualidades é exaltar os defeitos (o
jornalismo está livre disso). Quem morre torna-se apenas um corpo e não é pela
sua vida ou por seus feitos que se está ali, mas pela sua morte, pelo seu fim
nesse nosso plano. E não há glória espiritual na morte. Exceção foi a de
Cristo, que não morreu por seu parente, por sua própria honra, por seu país... Ele
morreu pela paz de todos e por amor a todos. E não foi vencido por ela, mas
subjugou a morte.
Um minuto, uma hora, um dia de silêncio é essencial e retrata
bem o espanto e o pesar pela morte de alguém querido. Porque a morte é o vazio
pleno, a ausência real, a perda absoluta, a separação completa... poderia o
enlutado, naquele momento, diante da morte, se rir de todos os viventes, não
fosse a dor inteira que sente. A tragédia sempre foi mais forte que a comédia. Vemos
isso nos eruditos gregos, em Dante e em Shakespeare. Pois a morte é a cessação
de todas as glórias, sonhos e aspirações nesse mundo de expiação e catarse. Contudo
os vivos se iludem com a vida, esse sopro que se esvai por banal motivo. Temer
a morte é ter medo do inevitável. A poetisa Nádia F. M. de Amorim escreveu:
“Minha morte nasceu quando eu nasci/Despertou, me enlaçou, cresceu comigo/E
dançamos de roda ao luar amigo/na pequenina rua em que vivi”.
Usando parte do poema Rima de Seféris poder-se-ia descrever o
ápice do sentimento da perda de alguém muito importante: “É esta a hora em que
sufoca a tarde/E eu me afadigo a procurar as trevas...” Do último que sepultei,
disse aos seus parentes: “era meu amigo”. Mas ser amigo não é qualidade, é
opção. A gente escolhe de quem ser amigo. Não lhes disse do pai amoroso que ele
era. Se fosse necessário dizer isso a seus filhos é porque eu havia me
enganado. O nosso amor mais profundo está nisso: nos filhos porque escolhemos tê-los
e nos pais porque escolheram nos ter. Mas, amor sublime está no de Cristo,
sobre o qual alguém muito bem escreveu: “Jesus, para entender o seu amor basta
entender que as flores não vão nascer sem que exista uma semente para oferecer
a sua própria vida, morrendo e gerando outras vidas, como tu fizeste”...
Alberto Magalhães
Nenhum comentário:
Postar um comentário